A dor que vem da alma
Ansiedade em tempos de crise
Sempre que eu tenho crise de ansiedade, a minha terapeuta me recomenda escrever.
Escrever o que estou sentindo e pensando.
É como uma forma de direcionar para uma folha de caderno toda a dor da alma que eu acabaria descontando em mim mesma: me agredindo, me diminuindo, me sentindo um pedaço de nada.
Na maioria das vezes que eu escrevo, fica só comigo. Como um diário.
Certa vez, resolvi publicar umas dessas minhas reflexões, chamada “Carta de acolhimento para mim mesma”.
Não fazia ideia da repercussão disso, a quantidade de acolhimentos e agradecimentos que recebi. Pessoas dizendo “Você descreveu exatamente como me sinto”.
Isso é maravilhoso, mas ao mesmo tempo triste, porque muitas, muitas pessoas se identificaram com o que eu escrevi. E eu senti a solidão e o desespero de cada uma delas.
Sofrer de ansiedade dói. Mas não é uma dor daquelas que passa após uma noite de sono. Não. A dor da ansiedade não vai embora. Ela se esconde. Podendo inclusive se esconder por meses.
A dor da ansiedade é perversa. Ela se manifesta no acontecimento mais banal, naquele gatilho que você, de forma inocente, achou que já tinha superado.
A crise de ansiedade começa silenciosa.
Primeiro vem um incômodo, uma sensação de que você não devia estar naquele lugar, naquela conversa.
Depois vem o formigamento, que começa nas pernas e sobe até à cabeça.
Esse formigamento é seu corpo dizendo: “você está em perigo.”
O que uma pessoa “normal” faz diante do perigo? Reage. Luta. Foge.
O ansioso não. O ansioso paralisa. Entra em choque.
Faltam palavras, porque não é possível mais organizá-las em um pensamento.
O que sobra para nós é o silêncio. O silêncio que faz a pessoa do lado de lá, já irritada com seu olhar catatônico, perguntar: “e então, você não vai dizer nada?”.
Esse é o silêncio que precede a tempestade. Porque daqui em diante, a crise de ansiedade já não será mais silenciosa.
A mente, nessas alturas, já está explodindo. O corpo sua frio, o coração palpita forte, sem ritmo.
Falta ar.
Você puxa e ele não vem. O desespero aumenta. As lágrimas caem.
A dor é tão grande que enrijece o corpo. O choro é compulsivo.
A vontade é transformar em dor física essa dor que vem da alma.
Dor da alma… algo que talvez nenhuma ciência consiga explicar.
Bater com a cabeça na parede? Já fiz.
Puxar meus próprios cabelos com força? Também.
Quem de fora se depara com uma cena assim, pode pensar duas coisas: “que frescura, que exagero” ou “interna que tá doida”.
Não vou culpar quem não sabe lidar com alguém tendo uma crise de ansiedade na sua frente.
Mas quero pelo menos te guiar, te conscientizar e te fazer entender algumas coisas:
- Não é drama.
- Não é frescura.
- Dizer “você precisa se controlar” não ajuda.
- Dizer “vai passar” não ajuda.
- Não é agindo com agressividade que você impedirá que a pessoa em crise faça algo contra ela mesma.
- Isso não é coisa de gente mimada, despreparada, louca.
- A pessoa que está em crise não age assim para, de alguma forma, te atingir, para que você sinta remorso pelo que fez ou falou.
Ninguém, nem a mais masoquista das pessoas quer ter uma crise de ansiedade.
Porque se a crise em si já é a dor mais profunda, paralisante e obscura, o que vem depois dela é ainda mais devastador.
Seu corpo é tomado pelo sentimento de culpa, fracasso, solidão e medo, muito medo.
Medo do abandono. Medo da rejeição. Medo de não pertencer. Medo de não merecer. Medo de não ser capaz. Medo de não ser boa o suficiente. Medo da dor nunca passar.
Porque essa dor intensa, essa maldita dor consome todas as energias vitais do seu corpo e te faz acreditar que você não é hábil o suficiente para superar.
Sabe qual é a vontade que dá? De desistir. De sucumbir. De morrer.
Porque nada parece fazer sentido. Porque sua vida vale menos que nada. E as pessoas não merecem ter uma pessoa tão ruim como você perto delas.
Sei que soa completamente desesperançoso escrever sobre isso diante do cenário caótico e recluso que estamos vivendo.
Até agora você não encontrou nesse texto nenhuma palavra de conforto.
Bem, receio dizer que não vim aqui te confortar.
Não vim dizer frases motivadoras e de como você pode se reinventar na crise.
Não vim dizer para você fazer 30 cursos e assistir uma enxurrada de lives vazias.
Não vim falar de “business”, de “mercado digital”, e do apelo para você não quebrar e não deixar que seus clientes quebrem.
Sabe aquela galera que está todo dia fazendo lives e lives no Instagram? São todos imperfeitos. Todos apavorados. E estão tão ou mais perdidos do que você.
Nenhum deles tem uma fórmula para o sucesso.
Ninguém está trabalhando em “alta performance” na crise.
E você assiste tudo isso pensando que existe um corrida contra o tempo e que nessa corrida você está para trás.
E que você precisa fazer alguma coisa desesperadamente para mudar, senão você vai perder.
Em todo lugar o que você encontra é:
“Você está sendo improdutivo em home office? Veja aqui as 7 dicas para aumentar a produtividade”.
“Você está ocioso, desmotivado? Faça 15 min de exercícios para deixar a barriga chapada.”
“Não está dormindo direito? Veja como meditar”.
Sempre alguém vai ter uma solução para os seus problemas, mas lembre-se, lembre-se meu amigo, que os problemas dessas pessoas são ainda piores que os seus.
Porque elas talvez não tenham tido coragem ainda de encarar o quão miseráveis são suas vidas. Solitárias. Falsas. Vazias. (Não quero generalizar).
Enfim, não se iluda. Não crie falsas idealizações. Porque isso leva à ansiedade.
E a ansiedade, como você já deve ter notado aqui, não é nada divertido.
Portanto, se permita à ociosidade.
Permita-se a fazer nada.
Permita-se a jogar um jogo idiota de celular.
Permita-se a não atingir suas metas.
Permita-se a mandar um meme bobo no grupo da família.
Permita-se a tomar um banho de 40 minutos ouvindo a playlist que você mais gosta.
Permita-se se fazer de bobo. E de não levar tudo tão à sério. Isso serve para mim também.
E se você for esse tolo que eu estou te falando pra ser, eu te digo: as coisas vão dar certo do mesmo jeito.
E lembre-se:
VOCÊ NÃO ESTÁ SOZINHO NESSA!
VOCÊ NÃO ESTÁ SOZINHA NESSA!
Estou aqui. Estamos juntos nessa.
E saber que você leu meu texto me conforta. Obrigada por isso.
E para finalizar, seja consciente e #FIQUEEMCASA
Tamo junto,
Fernanda Rocha
Ansiosa, introvertida, mãe e esposa imperfeita